domingo, 27 de junho de 2010

E dez anos se foram...

Naquele ano ela faria dez anos de fim do segundo grau. A escola já era apenas um conjunto de memórias, algumas boas outras não tão boas assim. Agora, ela segurava aquele convite para o baile dos ex-alunos da mesma forma – e com o mesmo medo- que agarrava os boletins bimestrais. Tinha uma decisão importante ali.

A vida não tinha seguido os planos da adolescência, alguns sonhos tinham se perdido pelo caminho, novos apareceram e ocuparam o lugar dos antigos. Já não se achava capaz de mudar o mundo, deixara de ser uma questionadora feroz. A idade tinha acalmado o gênio forte.

Ela era bem sucedida, jornalista, pós-graduada e recém mestre. Mas ao invés de correspondente de guerra, ela escrevia sobre o comportamento cosmopolita em uma revista feminina de grande circulação. Não eram os problemas mundiais que passeavam entre as linhas de seu texto, sim os cosméticos anti-rugas e os lançamentos do mundo da moda.

Com aquele convite em mãos, ela decidiu checar os compromissos da data, podia ser bom reencontrar o passado. Lembrou que antes suas agendas eram recheadas de recadinhos, colagens e confissões de sentimentos que só ela conhecia. Em algum canto do armário, os diários ainda existiam, guardavam as memórias de um tempo especial.

Era hora de abrir sua cápsula do tempo, talvez descobrisse em que ponto se perdeu em meio a rotina. Tirou a caixa empoeirada e a observou, não sabia o que sairia dali. O apartamento de repente pareceu pequeno para a quantidade de lembranças que se abriam diante dela. Existiam feridas que ela teimava em não reabrir, não sabia se estava pronta.

O primeiro beijo. O amor arrebatador. A primeira transa. A desilusão de algo que enfim não era tão para sempre. O fim do colégio, as promessas de amizade eterna. Como perdera tanta gente pelo caminho? Era com ele que ela iria casar e ela seria madrinha de seu casamento. Por que ainda moravam na mesma cidade e se viam tão pouco?

As páginas descreviam sua primeira grande perda. A morte do avô lhe causara danos, uma montanha-russa de emoções, não sabia como alguém podia ter sido levado dela tão rápido e sem aviso prévio. Tudo escrito em detalhes, a notícia, os dias sem comer, a família reunida, os parente de fora e a dor que parecia incurável. Chorou.

Veio o vestibular. As primeiras aulas na faculdade. O jornal laboratório, os congressos, os concursos. Enfim a graduação, novos sonhos e mil expectativas. O primeiro emprego,não tão dos sonhos assim. A especialização fora do país, novas promessas, e a volta não tão planejado. Tudo ali, narrado por quem mais conhecia cada história.

O emprego na ONU ficou para depois. O convite para a revista. A idéia era ficar um ano, mas veio a promoção e outra e lá se iam quatro anos. Os objetivos tinham mudado, a idéia de realização já tinha um novo sentido e ela não sabia se a mudança de paradigma lhe agradava tanto. Ficou confusa.

Olhou o convite mais uma vez, pensou em que roupa usaria. A escolha não foi fácil, o espelho teimava em apontar falhas, mas ela foi firme e saiu para o baile. No caminho ainda pensou em voltar, alguns ela ansiava por ver, outros torcia pela ausência. Estacionou e teve medo, esqueceu como seria difícil pisar ali sozinha. Entrou no salão e um abraço conhecido lhe fez lembrar porque quis tanto estar na festa, pensou em como tudo era tão mais simples naquele tempo. Simplesmente Sorriu.

4 comentários:

Rodrigo Vignoli disse...

Nossa, cara, parei na metade! hahaha
Não pude continuar por que não quis "prever" o futuro.
E apesar de desacreditar na possibilidade de um futura baile de ex alunos, penso que, ocorrendo de fato, a maioria ali reunida se gabará de já ter se destituído das ilusões da vida sendo esta será só mais uma das muitas.

Bem, eu vou me acalmar e vou ler mais uma vez, desta vez por completo, prometo!

Marco disse...

Muito bom o texto. Me fez lembrar dos meus perdidos pelo caminho e das pessoas que ficaram. Daqui a pouco serão mais 10 anos... e até lá, faremos tudo diferente? Sei lá, mas gostei de te ler.

Cynthia Gonçalves disse...

Simplesmente lindo... me emocionei.
Só posso lhe dar os parabéns, e torcer que continue nos presenteando com seus textos. Vou adicionar seu blog na lista dos meus preferidos.
Quando tiver um tempinho me visite hojesouassimepronto.blogspot.com

Stella Ramos Pereira disse...

Olá... visitei seu blog que está na lista de favoritos da minha amiga Cynthia, essa que comentou por último. Adorei o texto, envolvente... tem muita verdade nele. Me fez pensar, que apesar dos sonhos não realizados... a vida desta pessoa foi repleta de realizações. E talvez, pela falta do que não foi realizado ou que foi sempre sendo adiado, não tenha conseguido valorizar o que conquistou. Quantas pessoas vivem assim...
Vou visitar seu blog mais vezes. Se quiser, visite o meu: http://construindosentidos.blogspot.com/

Parabéns!
Abraços!