quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Um melhor contexto

Como boa historiadora, penso em contextos, nada faz sentido quando retirado de sua realidade social. Seguindo esse raciocínio, faço minha reflexão sobre esse 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra. Há pouco, foi perguntada a minha opinião sobre o trecho retirado da entrevista do ator americano Morgam Freeman em que ele se opõe ao “Black History Day” e concluo que no constructo social que ele vive a colocação faz sentido, no Brasil, talvez não, em função de percursos e tragetórias.

O processo de colonização americano criou um país com diversas organizações econômicas. As colônias do norte que se mantiam voltadas ao mercado interno e com uma industrialização incipiente e as do sul que se baseavam na agroexportação e na mão de obra escrava. Essas diferenças  gerariam a Guerra de Secessão anos mais tarde, deixando marcas de separação que refletem até os dias atuais. A  luta pelos direitos civis e contra um regime opressor e segregacionista - que renegava o direito a sentar em bancos de ônibus, de ingressar na universidade ou ao voto - são evidências de uma tragetória marcada por conflitos. Assim, era estabelecido, os brancos de um lado e os negros de outro, de preferência em um lado bem longe. Movimentos com luta armada como o Black Power e o Black Panthers  ou a liderança pacífica de Martin Luther King e o famoso “i have a dream” que lhe renderia o Prêmio Nobel em 1964 se tornaram famosos no mundo todo.

No Brasil, o percurso histórico dos negros se difere, não tivemos segregação explicita. Nossa questão está na construção do imaginário popular sobre os negros, a mesma ideia lusitana do negro forte, de sexualidade exacerbada, do exótico. O negro visto como a raça inferior, incapaz, imagem incrustada na população e um preconceito silencioso, com a sombra de uma democracia racial, de um país com origem sincrética e agregador. Segundo dados do IBGE,  o tráfico de escravos trouxe quase dois milhões de negros para o país e trezentos anos depois, o fim do regime escravista colocou toda essa população à margem da sociedade, sem colocação no mercado, sem educação, sem moradia e sem qualquer proteção à subsistência.  A reforma Pereira Passos e o processo de higienização da cidade deram início a formação das favelas cariocas, majoritariamente negras, que se transformariam em grandes problemas de governo anos mais tarde.

Atualmente, o preconceito se dá pela via econômico-social por aqui, não necessariamente pela cor da pele, há um racismo velado, que se esconde. Mas o problema está presente nos números, os indicadores mostram que as maiores taxas de anafalbetismo, desemprego, evasão escolar, violência, mortalidade e outras se encontram na população negra. O último censo do IBGE trouxe uma quebra de paradigmas, 52% da população se declarou negra ou parda. Sempre soubemos esse dado no senso comum, mas a novidade é a identificação, o critério do censo é a auto-declaração, ou seja pela primeira vez a “raça”negra perde o caráter pejorativo e inferior e as pessoas querem ser ligadas a ela, se “assumem”.

São para reflexos desse tipo que no país se trabalha com ações afirmativas, como a política de cotas, uma vez que 58% das pessoas no Brasil mantém a mesma posição social de uma geração par outra, se considerarmos as taxas de destribuição de renda entedemos a gravidade da situação. Em abril desse ano, o STF validou as cotas. O argumento que cota é reafirmação do preconceito e absolutamente vazio quando não se conhece os indicadores sociais do país. Não se pode falar em equidade quando mais da metade da população do país é negra e eu só tinha dois sentados comigo no banco da faculdade .

Não chame Morgan de blackman porque de fato, não o define, queremos sumir com os esteriótipos engessadores. Mas por aqui, prefiro que me chame de preta, porque não quero o morena- claro, jambo ou escura, não me ofende, me enobrece. Quero meu cabelo enrolado e meu nariz de batata. Não quero ser igual, quero os mesmos direitos. Quero melhores taxas quando estudar os indicadores sociais do país. Como boa historiadora, só quero um contexto mais favorável, melhores realidades e que o sonho possa ser concretizado, não um dia, mas agora. Feliz Dia da Consciência Negra!


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