Nessa minha vida de leituras aleatórias eu tenho reparado em
como escrevemos mais com um coração partido, pelo menos eu escrevo mais, e a
contar pelo comportamentos de alguns outros autores acho que posso afirmar
minha impressão. É como se a dor pudesse ser amenizada ao transportar para o
papel o que não cabe em si. No meio do sofrimento, quando parece que a água da
ansiedade só sobe e brevemente vai nos afogar, quando tudo perde proporção e
sentido, escrevemos. Mas é aí que reavaliamos, repensamos comportamentos, que
sentimos o bichinho da mudança. Mas pouco conversamos sobre recomeços, porque
mesmo com toda poética e infinitas possibilidades, reiniciar é absolutamente
assustador.
Muitissimo mais fácil se manter no conforto de um
lugar-comum, mesmo que aos pedaços e meio falido, porque colocar o pé pra fora
e se jogar no novo, sem saber muito bem o que esperar, empurrar a porta é para
os que tem muita coragem. Acho que todo mundo já enfrentou um tempinho a mais
em uma relação fracassada por medo da solidão, ou até pelo menos estar pronto para encarar um salão sozinho de novo.
Eu já coloquei pontos finais algumas vezes, em outras
colocaram o final por mim. Algumas histórias eu insistia em não querer terminar.
Sempre fui de ficar, permanecer até que a última chance escorresse, porque aí
eu ia embora de vez, mas ia com certeza de que pelo menos a minha parte eu
tinha cumprido. Um jogo bastante sofrido, confesso, mas é o ônus da minha
passionalidade.
Agora nesse negócio de recomeçar sempre engatinhei, levo
muito tempo me livrando do antigo, criando novos espaços e me desfazendo da
toda a tralha emocional. Passo por um imenso ritual e viro uma criatura bastante medrosa, gato escaldado com
medo até de água fria mesmo, dessas que prefere não se arriscar e vai minando
possibilidades porque a lembrança da ferida ainda é latente. Nenhum problema
com o tempo, se não fosse perder um bocado de gente bacana estacionada no que
passou.
Sempre morri de inveja do pessoal que tem um amor da vida
por semana, que se apaixona perdidamente com duas trocas de olhares, faz juras
de amor infinito, aí não da certo, termina, se acaba em lágrimas, diz que vai
morrer e semana que vem se apaixona de novo. É muita coragem. Eu levo uma
eternidade pra me apaixonar e acho que duas pra desapaixonar. Também invejo o
pessoal que abandona carreira e muda tudo porque resolve que quer fazer outra
coisa, viver em outra cidade, país ou sei lá virar monge. Invejo o desapego.
É preciso ousadia pra bater a porta sem olhar pra trás, mas
é preciso ainda mais pra não voltar e abri-la, porque na hora da dúvida essa
vontade de correr pro conhecido chega, as vezes chega forte. E vem o tempo para
procurar novas portas por aí, de saber a
hora de pedir ajuda, de engolir o orgulho, de aprender a ouvir e mais que tudo
se permitir mudar. Perdemos muito tempo sendo deterministas, eu perdi muito tempo assim, levando opiniões a ferro e fogo, me cobrando coerência
e me engessando. A maturidade (e a terapia) me trouxe muito mais flexibilidade,
somos muito menos caretas aos 30 que aos 20, como li outro dia. E sobre a
solidão, eu sempre gostei muito da minha companhia, mas descobri que não
preciso ser só um o tempo todo. Coragem mesmo é saber recomeçar, ando me
encontrando com a minha, talvez até dando uns passinhos. Reiniciar é
assustador, mas tem lá sua diversão também.
Um comentário:
Fui lendo, revivendo fatos, dores, amores, desamores, incertezas e certezas...
Escrever só faz sentido quando alcançamos o coração das pessoas e vc alcançou o meu...
Escreva sempre! Beijo!!
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